Não compreendo. Sou um estudante das pessoas, vejo e revejo, acções, atitudes, formas, fluxos, ambientes, tudo que me interessa são as personagens. Chego a conclusões, sempre sem fundamento com a excepção do momento, a partir dai desenho o futuro, das personagens e mais interessadamente o meu.
Funcionou durante muitos anos, talvez eu fosse mais observador do que sou agora, talvez tenha tido sorte, provavelmente sempre falhou mas nunca me apercebi dos erros, agora... sofro cada vez mais com a acumulação desses erros. Sofro porque não percebo, as peças não encaixam, sinto me alguém de sessenta anos no mundo moderno, quando me vêem sou transparente, não tenho segredos, quando vejo não vejo, percebo mas rapidamente me desiludo com a solução errada. Sinto-me a saltar a fase em que se é confiante e determinado, passei da adolescência à terceira idade, nunca cheguei a ser adulto, acho que nem sequer fui um jovem adulto onde acredito no que a minha mente me diz, mesmo desconhecendo a verdade.
Acredito que mesmo assim hei de conseguir ter a cabeça arrumada, não é possível que fique confuso sempre. Afinal de contas ainda hoje, a menina que estudava no centro comercial sorriu-me, o meu amigo com o inesperado filho cumprimentou-me e olhou-me com o ar de quem diz que estou no caminho certo a estudar, a senhora que me vende o café continua surpreendida com a quantidade de vezes por semana que estudo e os velhotes da mesa do lado espreitaram para as minha matérias e comentaram como devem ser interessantes e como no tempo deles lhes custava estudar mas como também era bom estar com a Marianinha lá do colégio. Tudo isto são sinais positivos, não?
Continuo esperançado que sejam sinais, de que qualquer dia conseguirei ter, ou pelo menos iludir o próximo de que estou tão tranquilo como ele. O meu objectivo ainda é o mesmo de quando entrei na faculdade, de resto é o único ponto que se mantêm igual, a minha obsessão com a inatingível tranquilidade. Não quero riqueza, nem poder, desejo apenas tranquilidade. Provavelmente é o que me falta, um objectivo ambicioso, alguma ganância de desejo de poder, talvez se conseguisse interessar-me em ganhar mais de que o próximo, ganharia também a sua tranquilidade. Mas como se pode ganhar tranquilidade roubando-a a alguém? Não é incomodativo ser um ladrão de tranquilidade? Sangue frio e racionalidade é tudo o que é preciso. Talvez... Mas não me interessa, quero uma tranquilidade construída por mim, algo que eu conheça e saiba porque ficou assim, mais importante, que não me possa ser roubada.
Parece desinteressante esta ideia de tranquilidade, todos apreciam o movimento e o estremecer natural das coisas, mas continuo sem me importar muito, talvez quando me importar as coisas mudem.
Falta-me crescer, ganhar aquele gostinho a sangue para me tornar em mais uma maquina de matar num fato, onde a alegria vem com o ordenado e as grandes questões de dividem entre o que se ganha e o que se faz. Mas por enquanto as questões continuam a estar ligadas ao desejo da tranquilidade, ao contribuir para a tranquilidade dos outros, ao fazer o melhor que se pode e que se acha, finalmente, à bimba imagem do nascer do sol na praia, que é sempre um cliché, mas continua a ser a melhor sensação do mundo!

P.S.: mesmo depois de tanto tempo sem escrever, continuo sem fazer sentido.